Lei 14.843/2024 condiciona progressão de regime a exame criminológico, evitando retrocesso no sistema carcerário.
Via @consultor_juridico | A Lei 14.843/2024, que estabelece a necessidade de realização de exame criminológico para a progressão de regime, foi considerada inconstitucional pela juíza Renata Biangioni, do Departamento Estadual de Execução Criminal da 5ª Região Administrativa Judiciária de São Paulo. A decisão foi fundamentada na violação dos princípios da individualização da pena, da dignidade da pessoa humana e da duração razoável do processo. Com base nesse entendimento, foi autorizada a mudança de regime de um preso do fechado para o semiaberto, após cumprir o tempo necessário e demonstrar bom comportamento.
O exame psicológico é uma ferramenta importante na avaliação do indivíduo e pode influenciar diretamente nas decisões judiciais, como no caso da progressão de regime do preso mencionado. A juíza considerou que a exigência desse tipo de exame violava direitos fundamentais, destacando a importância de respeitar a integridade e a individualidade de cada pessoa envolvida no processo penal. A decisão ressalta a necessidade de garantir que as medidas adotadas estejam em conformidade com os princípios constitucionais, assegurando assim a justiça e a equidade no sistema carcerário.
Impacto do Exame Criminológico na Progressão de Regime
O Ministério Público solicitou, porém, que ele passasse pela avaliação psicológica antes de obter o benefício, conforme estabelece a Lei 14.843/2024. Em vigor desde abril, a chamada Lei da Saidinha diz que todo preso deve se submeter ao exame para ir para um regime mais brando de cumprimento de pena. Ao fundamentar a decisão, a juíza fez um estudo sobre o debate construído em torno da exigência do exame criminológico. Ela lembrou que, em sua redação original, o artigo 112, parágrafo único, da Lei de Execução Penal previa que a decisão relativa à progressão seria precedida da avaliação.
Entretanto, prosseguiu Biangioni, a obrigatoriedade do exame acabou sendo retirada do texto legal pela Lei 10.792/2003, que alterou o artigo 112 da norma, passando a exigir apenas o bom comportamento na prisão, comprovado pelo diretor do estabelecimento. E isso porque, na prática, era impossível fazer o exame ‘na forma, com o cuidado e com a profundidade científica que a lei exigia, haja vista a notória insuficiência de serviços técnicos e de pessoal em número suficiente para atender às demandas necessárias para adequado funcionamento do sistema’.
Com base nessas considerações, Biangioni classificou a Lei da Saidinha como ‘evidente retrocesso no sistema de execução de penas’. Para ela, a norma impõe aos presos uma situação ainda mais grave do que a anterior — ‘seja porque a população prisional aumentou significativamente, seja porque as unidades prisionais apresentam evidente insuficiência de técnicos para conduzir os atendimentos em tempo razoável’. A juíza acrescentou que o Supremo Tribunal Federal entende que o texto constitucional é incompatível com a ‘exigência indiscriminada’ de elaboração prévia de exame criminológico quando não houver elemento concreto sobre a personalidade do preso capaz de impedir a progressão do regime.
‘Evidente, pois, que a nova legislação, no ponto que determina a realização obrigatória, indiscriminada e abstrata do exame criminológico como requisito à progressão de regime, padece de inconstitucionalidade, por violação aos princípios da individualização da pena, da dignidade da pessoa humana e da duração razoável do processo’, disse a juíza, para quem alteração na lei deve levar ao agravamento do estado de coisas inconstitucional no sistema carcerário. Atuou em defesa do preso a advogada Tamara Cavalcante.
Desafios na Implementação do Exame Criminológico
A necessidade de avaliação psicológica e criminológica dos detentos antes da progressão de regime é um tema complexo que levanta diversas questões no sistema carcerário. A Lei da Saidinha trouxe à tona a discussão sobre a eficácia e viabilidade desses exames em um contexto de superlotação e escassez de recursos técnicos.
A juíza ressaltou que a exigência indiscriminada do exame pode representar um retrocesso no sistema de execução de penas, colocando os presos em uma situação ainda mais delicada. A falta de estrutura adequada para a realização dos exames, aliada à crescente população carcerária, torna a implementação da Lei da Saidinha um desafio complexo.
A advogada Tamara Cavalcante enfatizou a importância de se considerar a individualidade de cada detento ao avaliar a necessidade do exame criminológico. A inconstitucionalidade da obrigatoriedade abstrata do exame como requisito para a progressão de regime levanta questionamentos sobre a garantia dos direitos fundamentais dos presos e a humanização do sistema carcerário.
A decisão da juíza e a defesa feita pela advogada refletem a preocupação com a justiça e a dignidade dos indivíduos envolvidos no processo penal. A busca por soluções que conciliem a segurança pública com o respeito aos direitos humanos é essencial para promover uma progressão de regime justa e eficiente.
Fonte: © Direto News
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